Bia Bedran, contadora de histórias, compositora, atriz e escritora serve de inspiração para oficinas culturais do Bairro-Escola
por Leonardo Oliveira, Lucas Lima e Nany Rabello
Inspiração para professores e mediadores, ídolo para crianças de todas as idades, mulher de carne, osso, música e histórias. Muitas histórias. Bia Bedran faz parte da infância de muita gente, e do presente de muito mais.
Ora cantando, ora dando aula, ora escrevendo, Bia faz um pouco de cada coisa, e no fim das contas, faz tudo junto de uma só vez. “Eu não só escrevo. Se fosse só escritora, eu teria a rotina de ter que parar um pouco, mas não, tudo é na correria mesmo. Aí, na hora de colocar no papel um novo livro, eu paro um pouquinho, reservo mais horas do dia para aquela tarefa solitária, silenciosa de escrever”, conta.
Sua inspiração para contar histórias foi sua querida mãe, que lia contos para ela quando era criança. Bia ganhou seu primeiro violão aos 8 anos e aos 12 começou a se aprimorar na música. Além disso, como já era compositora, Bia criou a idéia de cantar os contos. “Eu reproduzia aquilo que ouvia sempre com uma canção que eu criava.”
Para criar suas histórias, Bia se baseia em lendas folclóricas. Depois que se tornou professora, começou um trabalho de pesquisa, já que gostava da literatura e era fascinada por cantigas de roda. Conta também que sempre que está montando um novo espetáculo faz uma pesquisa regional pra saber o que está acontecendo. “Se eu for para um grande centro me apresentar, eu sempre vou pros cantões pra saber quem está cantando o quê, quem são os contadores de histórias”.
Teatro e televisão
Outra grande inspiração de sua carreira foi seu primeiro grupo de teatro. Em 1973, sua família se juntou e formou o grupo Teatro de Quintal. Sua mãe fazia os bonecos, seu tio, engenheiro, ajudava a criar os cenários, seus primos tocavam, cantavam e atuavam, seu pai ficava na bilheteria enquanto ela atuava e narrava a história. “Nas peças sempre havia o momento em que o contador entrava e narrava o que aconteceria na cena, e era sempre eu. Eu aprendi fazendo, contando.” No teatro, Bia também aprendeu a misturar bonecos e atores em cena, ideia de uma antiga diretora de palco.
Entre as décadas de 80 e 90, quem assistia à TV Cultura poderia ver Bia Bedran em programas como “Lá vem história”. Apesar de ser do teatro, Bia gosta das câmeras. “Eu tenho uma relação mágica com elas.” Bia conta que na hora da gravação ou você sabe que é daquele ramo e tudo dá certo, ou você tem pavor do estúdio frio, e não consegue gravar. Sua carreira na TV não durou muito, mas ela é grata pelo tempo que passou no ar. “Aprendi muito”, conta.
Sua maior base é a literatura. Quando criança gostava de ler livros extensos, como os de Monteiro Lobato, e livros incomuns às crianças, como os de mitologia grega e de Machado de Assis. “Eu gostava de decifrar aquele pensamento intelectual.” Com nove anos de idade, Bia Bedran lia livros sem nenhuma ilustração. Ela diz que por sua mãe lhe contar várias histórias, ela acabou se apaixonando pela leitura, devorando os livros, e isso foi importantíssimo em sua vida e carreira.
Falar de literatura em um país com tantos analfabetos é coisa rara. Para Bia Bedran, o papel do contador de histórias é justamente impedir que se propaguem coisas como o analfabetismo funcional. “Aquele que lê sabe o seu caminho. O livro traz muito do conhecimento”, afirma.
A criatividade e musicalidade que ela traz para dentro das salas de aula com suas histórias encantam e apaixonam as crianças e as incentivam a ouvir histórias. A partir daí se desperta o interesse pela leitura, o que não é comum em nosso país. “Ela pode se vangloriar por ser quem é dentro de um país onde existe um grande numero de analfabetos e mesmo assim conseguir ser uma escritora de sucesso”, diz Renata Castro, professora do primeiro segmento do Instituto de Educação Cebolinha, que sempre utiliza as histórias de Bia em suas aulas. “A que mais gosto de trabalhar é “Boneca de Lata”. Acho que é a mais famosa também. Nela as crianças aprendem onde está cada parte do corpinho, tocando e dançando.”
Experiência e amizade
Além da tanta bagagem, ela traz amigos, como Seu Pedro, um semi-analfabeto que nunca passou pela escola, mas que é dotado de uma incrível sabedoria. Com 83 anos, esse baiano que há 67 anos mora no Rio, é sambista, cantor e inventor de histórias. Ele gravou uma fita cassete, levou na porta do estúdio e entregou a Bia, com a certeza de que ela se encantaria com seus contos. “Eu escutei e achei maravilhosas! Eu gravei muitas histórias dele e ano que vem vou lançar um projeto só de histórias dele.”
Em suas apresentações, Bia incentiva as crianças a participarem com ela, seja levantando na hora de cantar e dançar alguma música ou respondendo perguntas feitas por ela. Todas as crianças (e os adultos presentes) se animam e se rendem ao ambiente encantador e feliz que ela cria. “O presente que eu recebo todas as vezes que eu canto, são as vozes das crianças cantando junto comigo. É muita alegria, muita paz que eu sinto, muita vontade pra continuar.”
Falando de Deus, de amor, de família, de vida, de infância, de si mesma, cantando, lendo, motivando, ensinando e inspirando. É assim que Bia Bedran continua seu trabalho, pelo tempo que for preciso. “Ninguém faz o mal pra sempre e ninguém faz o bem pra sempre. As coisas cumprem um ciclo.”
E para nossos queridos oficineiros do Bairro Escola, Bia Bedran tem um recadinho: “Desejo boa sorte, e quero mesmo que passe mesmo adiante essas minhas idéias, porque o meu trabalho é mesmo pra isso, é pra ser recantado, reutilizado, recontado. Fico muito grata e muito feliz por isso.”
Inspiração dos futuros professores
Depois de tanto aprendizado, tanta estrada e tantos fãs, a menina que narrava suas próprias peças de teatro se transformou na mulher que inspira jovens e adultos, que canta e encanta em cima de um palco, que já é mais que parte de si mesma. “O meu papel é esse, contar histórias.”
Jaqueline dos Santos Souza, de 20 anos, conta a sua experiência com a metodologia de Bia. “Os brinquedos e as cantigas ajudam em todos os sentidos da aprendizagem”, conta a jovem, que concluiu seu curso de formação de professores em 2007. “É música e história educativa ao mesmo tempo. Quando as crianças cantam e dançam suas músicas, elas aprendem sem perceber. O que poderia ser uma aula chata acaba ganhando novos rumos.”
Segundo Jackeline, o trabalho do professor primário é bem difícil por diversos aspectos. Um deles é a dificuldade que algumas crianças encontram para aprender. Porém, muitas vezes as músicas da cantora e escritora podem ser a solução. “A partir das histórias cantadas de Bia, não há como alguém não absorver a mensagem que está sendo passada. Todos se divertem e aprendem, facilitando muito a vida do professor.”
A também normalista Claudia Sanches dos Santos, de 23 anos, conta o segredo de Bia. “O ponto crucial para quem trabalha com Bia Bedran no magistério é o uso de suas histórias para a pré-educação de crianças. Juntar música e história é sempre uma boa ideia quando se trata de crianças. Nós mostramos a elas um novo mundo, onde se soma o que elas já conhecem com o desconhecido”.
quinta-feira, 2 de julho de 2009
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