segunda-feira, 6 de julho de 2009

Diversão em equipe

VILA DE CAVA

Crianças que participam do Cine Arte Cidadão discutem cidadania
por Josy Antunes


Dia 29 de junho, última segunda-feira do mês. O papel fixado na porta da biblioteca, da Escola Municipal Orestes Bernardo Cabral, em Vila de Cava, anunciava a sessão do Cine Arte Cidadão, para a felicidade de duas das turmas de 4º e 5º ano. “Cada turma só vem uma vez, por isso o filme é sempre o mesmo: O segredo dos cinco furiosos” – contido nos extras do dvd “Kung Fu Panda” – explica Mônica Paulucio, professora de incentivo à palavra, que também faz o papel de “recepcionista” nas ocasiões. “O que a gente precisa quando vai no cinema?”, pergunta Mônica à turma, do lado de fora da porta que dava acesso a salinha decorada por ela. Muito animados, os alunos arriscam respostas como “dinheiro” e “pipoca”, e ficam surpresos ao saber do que lhes falta: o ingresso.

Nesse momento, Mônica começa então a distribuí-los. Feitos a canetinha vermelha na mão das crianças, as siglas “P”, “CR”, “CF”, “D” e “CP” carregam um mistério que seria desvendado para quem prestasse atenção no filme. O espaço, apesar de pequeno, consegue abrigar uma das maiores turmas da escola, da 4ª série, com cerca de 30 crianças, que sentam, sem reclamar, juntinhos no chão, para que todos possam ter uma boa visão da TV. Uma menina pergunta o porquê de estarem assistindo também aos traillers, e logo recebe a resposta de que no cinema de verdade também é assim. Quem explica é Mônica, sempre buscando fazer com que as crianças, que em sua maioria nunca foram a uma sessão de cinema “de verdade”, sintam-se em uma. Durante os 25 minutos do filme, com as luzes apagadas, todos se mantem com os olhos vidrados nas cenas. “A gente trabalha cinco valores: paciência, coragem, confiança, disciplina e compaixão”, esclarece posteriormente a incentivadora.

Com o término da exibição, os alunos passam a ser instigados com algumas perguntas, como “Qual personagem mais emocionou?”, “Que outro título você daria para o filme?”, “Alguém aqui tem as cinco virtudes que foram mostradas?”, gerando um debate entre a turma. As siglas vermelhas são então explicadas, é através delas que cinco grupos são formados, representando cada um dos valores, juntando os alunos com as letrinhas iguais. A divisão é realizada dessa forma para acabar com a formação das “panelinhas”, hábito já bastante conhecido.

Todos seguem para o pátio da escola e recebem a missão de criar um grito de guerra para defender seu grupo, valendo 10 pontos para a gincana que estava sendo iniciada. Gritos já conhecidos como o do “Passou, passou, passou um avião...” e outros, inventados na hora, animaram ainda mais os grupos, com exceção de um deles. Algumas das meninas estavam com vergonha, o que desanimou duas integrantes. Mônica aproveita a deixa para, além de motivar o grupo, falar sobre trabalho de equipe com a turma, por último acrescenta: “Vocês vão ficar sem esses pontos porque não fizeram o grito, mas ainda podem virar o jogo!”, incentiva.

Daniela - Cine Arte Cidadão



Poucos minutos antes do recreio das outras turmas se iniciar, o que atrapalharia o prosseguimento da atividade, a sala da educação infantil – repleta de cadeirinhas pequenas e objetos para os menorzinhos, que estava sem aula no momento – passa a abrigar a turma do Cine Arte. Uma batalha naval é organizada no chão, enquanto os grupos se acomodam no novo espaço, fazendo um esforço para ficarem em silêncio, apesar de eufóricos, para não perderem pontos por bagunça.

Um grupo por vez deveria escolher uma letra e um número e torcer para não dar um “tiro na água”. As tarefas descritas nos papeis virados para o chão eram baseadas no que havia sido recentemente aprendido e debatido, trabalhando o raciocínio lógico, matérias já vistas em sala de aula, os sentidos e o desenvolvimento da expressão corporal. Como no caso de Sandra Carvalho, de 11 anos, que se surpreendeu quando a mediadora auxiliar de Mônica leu que o seu grupo deveria realizar 30 polichinelos seguidos de 30 pulos, valendo 20 pontos. As meninas, sem pensar duas vezes, começam a se mexer, enquanto a turma grita “um, dois, três...”. “Gente, não desiste!”, grita Sandra, apesar de já sentir a perna doendo. “Foi cansativo”, conta ela após a prova, que exigiu de seu grupo uma grande disciplina.

Alguns momentos depois, passados “tiros na água” e algumas perguntas relacionadas ao filme, um grupo foi proposto a escolher um dos integrantes para ficar dez minutos com os olhos vendados, mergulhado sozinho no escuro, em um cantinho da sala. Confiante, Evelyn da Silva Barbosa ergueu o braço e disse “eu”. Os companheiros de time a olharam pasmos, enquanto a menina se dirigia para a frente da sala. “Eu fiquei com medo, foi difícil”, conta a menina, afirmando não ter pensado por nenhum momento em desamarrar o casaco que vendava seus olhos. “Eu não queria passar vergonha e não queria que meu grupo ficasse sem os pontos”, diz com convicção, após os longos minutos que passou solitária, como um exemplo de paciência e coragem. “Aprendi muita coisa com essa experiência, a ter força para enfrentar o que a gente não vê e o que a gente faz”, declara a menina de apenas 10 anos.
Exemplo de coragem também demonstrou Daniela Souza dos Santos, de 9 anos, vendada perante a turma, prestes a comer alguma coisa que não fazia idéia do que podia ser. “Tia” Mônica pergunta para os grupos adversários: “Ela come?” e recebe um sonoro “não”, enquanto seus companheiros de time a incentivavam. “Não mastiga, senão o sangue do bichinho pode escorrer da sua boca”, diz a educadora, com um sorriso não visto pela menina. “Eu pensei que fosse uma coisa gosmenta, todo mundo ficou falando pra eu não comer”, confessa a corajosa Daniela, “Mas eu sabia que ia ganhar os pontos, por isso que comi”. O “bichinho gosmento” na verdade era um limão.

A metodologia de Mônica, de trazer professores para as suas atividades, se fez presente na prova em que os participantes de um grupo deveriam sair pela escola e convencer uma professora a ter compaixão deles. Ela “só” precisaria ir ao encontro da turma e dançar na frente de todos a dança do “pintinho amarelinho”, usando uma peruca amarela. Ao adentrar a sala, a professora solidária levou um susto. “Eles só me falaram que eu tinha que vir até a sala do infantil. Não falaram que estava cheia”, diz espantada a professora, por coincidência vestida de amarelo.

Ao revelar a pontuação, depois de rufados os tambores – na verdade, as mesas – o grupo vencedor foi anunciado: o de Daniela. “É uma equipe, todo mundo ganhou”, diz a menina. O clima na sala, porém, foi de alegria geral, como se todos tivessem saído vencedores. “A gente tem que saber ganhar e saber perder”, exclama Mônica. A premiação também é para todos: muita pipoca, completando de vez o Cine Arte Cidadão, que acontece a cada última segunda-feira de cada mês.





Assista ao vídeo Cine Arte Cidadão



Interatividade:
Cite um filme no qual importantes valores também podem ser trabalhados nas escolas.

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