quarta-feira, 16 de abril de 2008
Nel-som Motta
O faz-tudo da cultura brasileira dá palestra no Espaço Cultural Sylvio Monteiro.
Texto e fotos de Giselly Reis
A apresentação do currículo de Nelson Motta, feita pelo jornalista iguaçuano Rogério Costa, já dava uma idéia do que ia ser a noite da última quinta-feira, no teatro do Espaço Cultural Sylvio Monteiro. O nome dele estava associado aos principais momentos da produção musical e jornalística brasileira do fim da década de 1950 para cá. Da bossa-nova ao rock. Da discoteca a programas jornalísticos em canais de televisão fechados.
Como ele disse com o seu jeito sempre doce, sua vida mudou quando ouviu as músicas com que o baiano João Gilberto deu um novo rumo para a música popular brasileira. Ele estava em São Paulo, cidade na qual nem parece que nasceu. Seus primos botaram o Chega de saudade para tocar. Nelson Motta nunca mais seria o mesmo depois de ouvir aquela mistura de samba brasileiro com jazz americano. Nem ele nem o Brasil.
A bossa nova tomou conta do país e do mundo – principalmente depois de um show no Carnegie Hall, em Nova York. Mas embora Nelson Motta odeie o radicalismo do crítico de música José Ramos Tinhorão, que ainda hoje não reconhece a importância da bossa nova, a geração musical de Nelson Motta tinha que rejeitar essa expressão cultural que foi a cara do otimismo do governo Juscelino Kubitschek, os chamados anos dourados.
A geração de que Nelson Motta estava falando incluía alguns dos maiores gênios da música popular brasileira. Faziam parte dessa lista nomes como Edu Lobo, Francis Hime, Chico Buarque, Dory Caymmi e os irmãos Paulo Sérgio e Marcos Valle. Eram amigos de praia e chope de uma Zona Sul idílica, que ainda não se sentia acuada pela violência urbana.
Essa geração começou a ganhar projeção com os grandes festivais de música da Record. Esses festivais de música estão para a música popular brasileira da década de 1960 como a bossa nova para a década de 1950. Os festivais da década de 1960 revelaram para o Brasil e para o mundo de Elis Regina a Milton Nascimento, passando por Caetano Veloso, Gilberto Gil e o próprio Nelson Motta. Por incrível que pareça, houve muitos outros nomes.
A música dessa geração acompanhava as grandes mudanças por que passava o país e o mundo. Essas mudanças eram de toda ordem, e começavam pelo golpe de estado de 1964. Houve também o surto de modernização do Brasil, que se manifestou na música pelo uso das guitarras elétricas. Mas a grande marca dessa geração foi a polêmica. Tudo era motivo de grandes discussões, grandes rachas, grandes debates. Quem gostava da música A banda, de Chico Buarque, odiava Disparada, de Geraldo Vandré e Theo de Barros. Esses ódios e amores eram manifestados com aplausos consagradores ou vaias humilhantes nos palcos dos festivais.
A geração de Nelson Motta não apenas deu uma nova cara à música popular brasileira. Ela acompanhou muitas mudanças políticas, como por exemplo o golpe de estado de 1964, o AI-5 em dezembro de 1968, a redemocratização imposta pelo general Ernesto Geisel e, por fim, o impeachment de Fernando Collor de Mello, o presidente eleito pelo voto direto em vinte anos. Decepcionado com a escolha do povo, Nelson Motta foi para os Estados Unidos no início da década de 1990.
Nelson Motta também é famoso como produtor cultural. Um dos seus maiores sucessos, no entanto, foi a discoteca Dancing Days, no shopping da Gávea. A discoteca durou apenas quatro meses, mas mudou a cara do Brasil principalmente depois que o escritor Gilberto Braga dedicou uma novela ao tema. Para Nelson Motta, o país, cansado dos chamados anos de chumbo, queria relaxar do baixo astral que foi a ditadura militar. Gente de todas as idades ia suar nas pistas de dança em que as Frenéticas ousavam dizer que queriam deixar os homens loucos dentro delas.
Na década de 1990, ele trabalhou na primeira geração do programa Manhattan Connection, que vai ao ar todos os domingos pelo canal fechado GNT. Ainda nos Estados Unidos, começou sua bem-sucedida carreira como escritor. Desde então vem publicando livros abrangendo desde o futebol – é apaixonado pelo Fluminense – até romances de geração – a sua, narrada no romance Ao som do mar, à luz do céu profundo. Seu último feito, Vale tudo, o som e a fúria de Tim Maia, entrou na lista dos mais vendidos desde a semana em que foi lançado, no fim de 2007.
Eu sou Giselly Reis e ainda bem que eu estava lá. Para contar para os muitos vacilões que não puderam aproveitar a aula do Nelson Motta.
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