terça-feira, 26 de maio de 2009

Luz, Câmara Cascudo e ação - A missão

Escola Livre de Cinema usa Câmara Cascudo para aproximar crianças do seu mundo
por Josy Antunes

“Aí, assim que o desconhecido, que era o filho dele, foi dormir, o velho matou, enterrou no quintal dele e depois pegou o dinheiro. Depois que o velho foi revistar a mala pra ver se achava mais alguma coisa, achou a identidade do moço e ficou sabendo que era filho dele. Aí se entregou à polícia.”

O trecho, contado por Thales Felipe, de 13 anos, descreve o final do conto “O velho ambicioso”, de autoria do escritor e folclorista Luiz da Câmara Cascudo. A história está sendo trabalhada na turma da Escola Livre de Cinema que ele frequenta, no horário integral do Bairro-Escola. Três outros textos do folclorista estão participando desse processo: “O bem se paga com bem”, “Mata sete” e “O mendigo rico”.

“A gente quer brincar com os gêneros”, explica Cristiane Braz, diretora da escola. Embora a literatura introduzida em salas de aula costume trazer uma soma de finais felizes e lições de moral que obrigatoriamente devem ser aplicadas na vida dos alunos, os alunos estão reagindo com bom humor à proposta de trabalho deste semestre. Um dos motivos para a escolha é que elas são de domínio público e, portanto, não é preciso pagar direitos autorais.

“Está sendo muito bacana”, garante Leandro de Souza, professor de Thales, para quem é apenas uma coincidência que as quatro histórias selecionadas tenham um final triste. Na verdade, os contos estão sendo usados como um dispositivo por intermédio do qual se possa fazer a mediação entre o folclore e a tecnologia. Nessa junção, os alunos também acrescentam sua vivência de modo a poder recontar as histórias sob a perspectiva do audiovisual.

As crianças, já mergulhadas no universo de Câmara Cascudo, trazem a realidade para os contos – ou vice-versa – através de memórias, experiências, observação de territór
io e até mesmo objetos. Cris Braz gosta de citar um exemplo para ilustrar esse processo. “Houve uma atividade em que a turma precisava fazer um chão de barro numa imagem e uma flanela foi usada, após ser scaneada, por ter a cor semelhante ao barro.”

O aluno tem inteira liberdade para caracterizar os personagens do modo como lhe convém. “O que a gente tenta é que eles realmente possam transformar coisas que estão em volta em imagem”. Despertar essa percepção nos alunos é um dos objetivos da metodologia aplicada através dos contos de Câmara Cascudo. Como exemplo da expressão dos alunos sobre os achados nos contos, estão os recortes e as colagens. “Ali ele representam os mais variados significados imaginados de palavras encontradas nos textos.”

Interpretação de gêneros
Intencionalmente, nenhum dos contos utilizados traz semelhanças de estilo. Há pelo menos dois objetivos para que os alunos estejam trabalhando ao mes
mo tempo com “Mata sete”, que dá espaço para que o lado cômico seja trabalhado, e “O bem se paga com bem”, que traz uma “moral da história”. “Queremos capacitar as crianças a interpretar gêneros e a fazer a mistura que elas quiserem com os temas folclóricos”, explica a diretora da Escola Livre de Cinema.

Outra mistura a ser feita ao longo da produção do semestre em curso abrange a Escola Livre de Música Eletrônica da Cerâmica, também administrada pela ong Reperiferia. “Eles ficarão responsáveis pela produção do áudio dos filmes que serão realizados”, informa Cris Brás. Também nesse caso os alunos terão inteira liberdade para fazer combinações, podendo usar estilos que vão do funk ao jazz como trilha sonora.

A importância dada às experimentações pode comprometer o resultado estético da produção desse ano, cujos filmes podem ser mais curtos e ter menos apuro técnico do que os do ano passado. “Não sei bem se a gente quer um acabamento tão perfeito como o da série “Iguaçu e sua turma”, que fizemos em 2008.” Os mentores da Escola Livre de Cinema ficarão plenamente satisfeitos se os alunos trouxerem o mundo deles para dentro do vídeo. “Proporcionar uma identificação e o reconhecimento de elementos próprios dos alunos ao assistirem os filmes é o que se espera alcançar dessa “catação” que tem sido realizada no cotidiano dos alunos.”


Interatividade:
Dê exemplos de objetos encontrados em sua casa ou experiências vividas por você que seriam bem utilizadas numa produção de audiovisual.

Um comentário:

  1. Meu pai é uma apaixonado por miniaturas em decoração de ambiente. Apesar de não ser muito fã, foram esses porta-retratos e vasos que me ajudaram a compor cenários nas atividades da Escola Livre de Cinema. Com certeza, passei a valorizar mais esses objetos.

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