Locutores atraem clientes para as lojas do calçadão de Nova Iguaçu
Por William Faria da Costa
Fotos: Mariane Dias
Quando você passa em frente uma loja, o que chama a sua atenção e faz olhar para ela? Muitos poderiam responder que é a vitrine, a beleza das roupas ou até mesmo os preços baixos. Mas eu estive no calçadão de Nova Iguaçu, no centro comercial da cidade, e percebi que as lojas utilizam o mesmo artifício para atrair os clientes: um locutor. Cabe a esses profissionais a responsabilidade de despertar a curiosidade de quem passa próximo à loja.
Como na maioria das biografias de seus colegas de profissão, Paulo Edinei Felix da Silva tornou-se locutor por puro acaso. Era uma época particularmente sensível para a Prolar, uma grande rede de papelarias na qual trabalha há seis meses. "Foi na volta às aulas", lembra esse homem de 31 anos, cujas jornadas diárias começam às 10h30 e se estendem até as 19h30.
Livro de slogans
Seu estilo sóbrio, desenvolvido nas aulas de música, no seminário de teologia e num curso de omilética, é bastante diferente da malha sonora que ecoa pelo Calçadão. "Procuro passar mais informações e chamar o público", diz. É mais comum encontrar por trás dos microfones pessoas mais joviais, como é o caso de Max Augustinho da Silva, um homem de 32 anos que tomou gosto pela profissão que abraçou de modo casual há três anos e à qual diariamente dedica onze longas horas. "Chego a me vestir de mulher para chamar mais atenção da clientela."
Max gosta do trabalho de locutor e já inventou diversos bordões. "É explosão, é explosão de preços baixos", apela. "Caiu, caiu o preço", continua ele, disputando a atenção dos clientes com locutores do porte de Reinaldo Andrade da Silva, da Kids Papelaria. "Neste ritmo assim, vem pra cá, você só tem a ganhar", anuncia Reinaldo, um homem de 27 anos que há quatro anos anota em um "livro de slogans" os bordões inicialmente testados com a esposa. "Aqui, você economiza no preço e lucra na qualidade", insiste. "Kids Papelaria, vendendo barato todo dia", acrescenta.
Reflexão divina
Inspirado no apresentador de televisão Sílvio Santos, Reinaldo da Silva desenvolveu o dom da palavra na mesma escola em que um percentual significativo dos locutores do Calçadão. "Faço narrações de peças teatrais na igreja", conta Reinaldo, que tem um filho de seis anos. Também foi por causa das reflexões divinas que faz no púlpito que Anderson Vieira não teve dificuldade para se adaptar à oportunidade que a Belíssima Presente lhe deu, há oito meses. Na guerra pelos ouvidos do formigueiro do Calçadão, os dois estão muito mais para o profano do que para o divino.
"Vem que tá barato", esgoela-se Anderson, que há oito meses se transferiu da Belíssima Presente para a Toma Lá Dá Cá. "Vem que tá bombando", acrescenta diante da loja a que só se refere como "o Casarão da Moda". Não muito longe dali, Thiago Lucas Camargo, que há dois anos e meio se posta diante da Babalu, acredita estar sendo original com bordões ensaiados em casa. "A loja que mais barato vende e melhor atende", diz, tentando rimar.
Futuro na rádio
Os parentes de Thiago Camargo vivem pressionando-o para que "invista na sua facilidade para falar em público", mas ele descarta a possibilidade de levar sua voz para as ondas curtas do rádio. Esse não é o caso do "cigano" Anderson Vieira, que já andou por rádios comunitárias de Anchieta e São João de Meriti. Não fosse a faculdade de radiologia que faz à noite, Reinaldo da Silva seguiria o exemplo de Paulo Edinei, que sonha em trocar o calor das ruas pelo ar condicionado de um programa radialístico. "Já fiz algumas participações em rádios comunitárias", vibra Paulo Edinei.
Os locutores têm que se desdobrar nos dias de sábado que antecedem as datas comemorativas, quando o povo trabalhador aproveita o dia de folga para fazer suas compras. "A Babalu fica tão cheia que a gente tem que limitar a entrada de dez em dez clientes", diz Thiago, para quem a função do locutor é a de animar os clientes já capturados pela loja. Max tem uma compreensão diferente da sua profissão. "No sábado a loucura na loja é tanta que às vezes me visto de mulher para chamar mais atenção da clientela", confessa.
Brilho nos olhos
Anderson Vieira também se veste de mulher, mas não nos dias de bonança do Calçadão. "Eu tenho que mostrar o meu talento no final do mês, quando não tem quase ninguém na rua", afirma Anderson, como sempre bem-humorado. Uma das razões para acreditar no seu talento está na cara de felicidade da filha de um ano, quando faz em casa as brincadeiras que faz na rua.
Também é na família que Paulo Edinei confirma a importância do trabalho que faz na rede de papelarias Prolar. "Meu filho, que tem cinco anos, gosta muito de me ver falando no microfone", lembra esse locutor, que eventualmente recebe a visita do fruto de um casamento já desfeito. "Seus olhos brilham, ele deve pensar que eu sou artista."
quarta-feira, 16 de julho de 2008
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